Quem nasce para lagartixa nunca chega a jacaré.
Amélia Folques
Quem nasce para lagartixa nunca chega a jacaré. Ressalvo que este texto não tem nada a ver com futebol. Só que é um excelente provérbio e lembrei-me dele de tanto cruzar com gente que sonha em um dia ser jacaré.
Somos forçados a viver com este tipo de gente. Pessoas sem estrutura, hombridade, seriedade e princípios.
Gente que nasceu ou cresceu, desenvolveu-se num limbo, no meio de um lamaçal. Viveram sempre em terreno estéril. Nunca souberam a importância do reconhecimento do outro, da rede entre todos, o que são raízes, o ter raízes, o criar raízes. Quer essas sejam na família, na sociedade, grupo de amigos ou mesmo em termos profissionais. Gente que não tem a mínima noção e desvaloriza o outro ser humano, que vive com as premissas erradas.
A palavra humano é desconhecida no seu parco mundo linguístico, diria mesmo misteriosa para essa gente. Qualquer portador de Asperger identifica, tem mais empatia com o outro que estes elementos.
Gente que faz literalmente tudo para se impor, para se colocar em bicos de pés e dizer aqui estou eu, querem ganhar visibilidade a todo o custo. Gente que na presença de alguém superior, com mais poder ou influência se humilha, se coloca de quatro, qual serviçal perante o amo. Acho que noutros tempos foram muito úteis como capatazes, tem o perfil certo para terem voz e autoridade perante os fracos, precários e desprotegidos.
Para fazer vingar o seu plano, por vezes só um triste e mísero plano, pois os sonhos e ambições efectivamente grandes e de relevo não os têm, destroem tudo o que seja válido. Pois esses podem por a nu a sua ganância ou mesmo incompetência, os seus esquemas obscuros e planos de bastidores. Essa gente nunca é clara nem óbvia é cínica e hipócrita, levamos algum tempo a decifrá-los.
O que assisto é a forma como levam a vida a desconsiderar, despromover ou desacreditar os outros. Manipulam a informação, boicotam qualquer esforço de melhoria, dividem para "reinar", empolam ou subestimam situações para “explicarem” os seus objectivos.
Qual réptil que tem várias peles e as vai usando de acordo com os diversos interlocutores. Vão mudando o discurso, adaptando sistematicamente a postura dependendo com quem estão a lidar e o grau de influência que querem ter nessa pessoa. Não têm só uma palavra, não têm só uma lógica, não têm só uma pele. Têm várias, várias verdades universais, muitas máscaras. E quando confrontados e sabem que já não vale a pena reencarnar mais nenhuma personagem pois o pano foi aberto e o palco está à vista, dependendo do contexto a resposta será eu não queria mas, eu não faço, eu não tive a culpa, não fui eu, pensei que era melhor assim, foi por bem, por vezes um deprimente eu é que mando como se isso fosse explicação para qualquer tipo de acção.
O que essas pessoas se esquecem é que os outros não são como eles e corre sangue quente nas veias, e que a vida dá muitas voltas. Os outros têm uma visão superior da vida, tem outras razões para a viver, objectivos reais e verdadeiros para lutar. A maldade ou a perversa existência deles para os restantes é vista como algo desnecessário mesmo fútil e mesquinho. São mesmo escusados.
A vida faz-se de alianças sinceras, de interajuda, de consensos simples e leais com base em relações honestas e transparentes e esta é a verdade para tudo que envolve a nossa existência: família, na sociedade, grupo de amigos ou mesmo em termos profissionais.
A esta espécie de pessoas lembro que quem nasce para lagartixa nunca chega a jacaré. Não me lembro de um ser deprimentemente maquiavélico não ser descoberto, de alguém que sofra de uma condição patológica do poder não acabar a ser tratado como um desequilibrado ou mesmo de um serviçal, invertebrado, prepotente e arrogante capataz chegar a dono da Herdade. E também quem semeia ventos colhe tempestades. Bem este último provérbio fica para um próximo texto.
O que eu queria mesmo era viver num mundo onde o Ser fosse mais importante do que o ter, e infelizmente esse ter para que tanto se batem e a tanto custo ser mesmo tão nanico, tão pouco e tão efémero.